Suponha a seguinte hipótese: você, sócio de determinada empresa, encerrou suas atividades sem cumprir com as formalidades legais, apenas “fechando as portas”.
Na hipótese do ajuizamento de eventual execução fiscal para a cobrança de tributos devidos pela empresa, você poderá ser responsabilizado?
A resposta dessa pergunta depende da análise de determinadas circunstâncias, as quais serão examinadas a seguir.
1. O QUE É DISSOLUÇÃO IRREGULAR?
Inicialmente, é necessário compreender o que se entende por “dissolução irregular” de determinada empresa.
A partir do momento em que uma empresa é criada, com sua consequente inscrição na Junta Comercial e aquisição de personalidade jurídica (CNPJ), essa pessoa jurídica passa a ter patrimônio e obrigações próprias, distintas das de seus sócios ou administradores. Vejamos o exemplo abaixo:
Uma empresa A realiza a compra de fornos da empresa B para melhor atender à sua demanda, se obrigando ao pagamento do valor de R$20.000,00. Contudo, passado o prazo estipulado, a empresa A não realiza a quitação do valor.
Nesse caso, a empresa B poderá ingressar com ação de cobrança contra a empresa A, mas não contra seus sócios, exceto se comprovada fraude. Isso significa dizer que, por mais que o sócio da empresa A tenha patrimônio suficiente para pagar a dívida, se sua empresa não possuir esse valor, a empresa B nada poderá fazer para receber seu crédito.
O mesmo raciocínio se aplica no caso de execução fiscal por dívida tributária. Se uma empresa estiver devendo o pagamento do IPTU, por exemplo, o município só poderá demandar seu pagamento para a empresa, e não para seus sócios ou administradores, exceto se restar comprovado que esses agiram com excesso de poder ou infração à lei ou estatuto social, nos termos do art. 135 do Código Tributário Nacional.
Essa proteção do patrimônio dos sócios e administradores decorre da autonomia patrimonial da pessoa jurídica regularmente constituída.
Do mesmo modo que se faz necessário o cumprimento de certos requisitos legais para que uma empresa possa ser constituída, é necessária a observância a determinadas formalidades para que essa empresa possa ser dissolvida.
No momento em que uma sociedade empresária encerra suas atividades, é preciso que ocorra um procedimento formal de dissolução, com a averbação de sua dissolução na Junta Comercial, de modo a tornar esse fato público, e a apuração do patrimônio da empresa, na qual serão verificados os créditos e débitos existentes, para que após possa ser realizado o pagamento dos credores e a divisão do que eventualmente sobrar para os sócios.
Esse procedimento é muito importante, pois, ao mesmo tempo em que garante o pagamento das dívidas dos credores, resguarda os sócios de eventuais ações de cobrança, uma vez que estes não poderão ser responsabilizados, já que seguiram todos os requisitos previstos em lei para o regular fechamento da empresa.
Todavia, caso diverso ocorre quando a dissolução da sociedade empresária se dá de modo irregular. Vislumbre o seguinte exemplo:
Lucas e Breno são sócios da Padaria A. Contudo, devido a problemas financeiros, desistem de sua atividade comercial, demitindo todos os funcionários e fechando as portas do estabelecimento, não tomando nenhuma outra providência para “dar baixa” na empresa.
Nesses casos, será possível a responsabilização dos sócios por dívidas tributárias? A resposta é: depende. Analisaremos duas situações distintas no tópico abaixo.
2. QUEM PODE SER RESPONSABILIZADO PELO PAGAMENTO DA DÍVIDA?
O Superior Tribunal de Justiça, nos temas 962 e 630 dispõe sobre a responsabilidade dos sócios pelo pagamento de dívidas tributárias em caso de dissolução irregular da sociedade.
Para que possamos saber se o sócio ou administrador poderá ou não ter a execução fiscal redirecionada contra seu próprio patrimônio em decorrência de dívidas da empresa, precisaremos analisar se o indivíduo ainda era sócio/administrador da sociedade no momento da dissolução irregular. Se o indivíduo ainda era sócio da empresa no momento da dissolução irregular, poderá ser responsabilizado. Se não o era, não poderá. Para que essa informação possa ficar mais didática, analisaremos o exemplo a seguir:
Lucas e Breno são sócios da Padaria A. No ano de 2019, Lucas deixou a sociedade empresária de forma regular, tendo averbado na Junta Comercial sua retirada da empresa. No ano de 2020, Breno, único sócio restante da empresa, decide encerrar a atividade empresarial, sem adotar as formalidades requeridas por lei.
Nesse caso, se o município ingressar com execução fiscal contra a Padaria A por débito relativo ao ano de 2018, poderá requerer o redirecionamento da execução em face de Breno, desde que a causa do redirecionamento seja a dissolução irregular da empresa. Por outro lado, não poderá demandar o pagamento da dívida em face de Lucas, uma vez que este deixou o quadro societário da empresa antes de sua dissolução irregular, não dando causa a esta.
Na hipótese mencionada, Lucas somente poderá ser responsabilizado se o município demonstrar que ele agiu com excesso de poderes ou infração à lei ou estatuto social no momento de sua saída da empresa.
Como se observa, é essencial que seja obedecido o procedimento formal de dissolução de uma sociedade empresária, de modo a evitar possíveis ações judiciais futuras. Para isso, é fundamental contar com uma boa assessoria jurídica empresarial, de modo a garantir maior segurança para o seu patrimônio e sua empresa.